domingo, 21 de setembro de 2008

não é uma referência a Augé

A cama recebe o corpo cansado. Cansados, deitamos. Adormecemos, a modo de equalizar as partes há muito adormecidas. A cama é lar, assim também estamos em casa. Erudita a cama, mais uma ficção. A última do dia; para relaxar as pálpebras, até que façam dos olhos pele. Estranhos sonhos extraños. E entranhados nas veias entorpecidas dos sonos guardados. Dos sonos rejeitados, tomados, dormidos pelos dias... Camas aladas: onde levam as mentes esgotadas e exauridas? Dorme-se. Sonha-se. perde-se a referência, que há muito se perdeu. A cama atende com generosidade o ofício de portal. Transfere e ressucita. Aquece: ainda as madrugadas estão geladas. Ainda as madrugadas liberam monstros, xuxas e pernas cabeludas. Útero, a cama; abraça, alimenta, conforta, conforma, abriga. Afasta o mal, por todo o perímetro do lençol. Fosso medieval, entre o castelo-colchão e a escuridão, nenhum mal adentrará. De modo que é também duro sair. Duro voltar, tarde que atina o sol, para o lugar que não é. E que não há.
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Sensação caverna do dragão: não estamos. Não estamos em lugar nenhum, não estamos. Não somos. Seguimos. In-to-xi-ca-ção. Porque nada é natural, para nossos corpos já construidos. Tudo é posterior à formação de nossa envergadura; carnadura e pensar. É arificial porque não nos concerne. Os venenos sao outros. Expressamo-nos, a conforme, a modo de compreensão. Tragamos o que há nesse mundo, ainda que não seja o mesmo mundo que há aqui dentro. Aqui dentro há moléculas marinhas latentes, atrofiadas, carentes. Nunca houve aqui dentro tanto frio, porque aqui dentro, o mundo é tropical. Somos tropicais por singeleza, por compleição, educação e consistência. Ainda que o homem possa adaptar-se; essa adequação é sempre anti-natural para o seu ser. Aqui há uma necessidade comovente de reinstauração. Uma súplica sanguínea, de existência. Que se abram as Portas da Esperança e – ainda que venha junto o Silvio Santos – nos trague esse mundo natural. Antes que a falta de mamão nos abale irreversivelmente o juízo e as melaninas moribundas recorram a eutanásia. Quebrados que foram todos os espelhos.
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Lost: o acidente é interno. O exilado é antes de tudo um náufrago.


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[ensaio fotográfico pelo centro de Córdoba, por Júlio Paiva]

à propósito, a primavera (! ) oficialmente, a partir de hoje - 21 de Setembro - está autorizado o uso de bermudas e estampas; a condição climática não mudou de um dia a outro, mas, ao que parece, a permissão social é o que manifesta a estação. Filha da dualidade climática -sol e chuva - não tenho autoridade primaveral, mas reparar é a atividade a que - cientificamente - me dedico no momento.

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